segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Morte natural e meios artificiais de prolongamento da vida

Dra. Carolina C. Cervone, Advogada e Diretora do Instituto Bio-10.

A Medicina avança e oferece recursos cada vez mais sofisticados para prolongar a vida humana. Mas tais recursos, por vezes, limitam-se a retardar a morte, prologando a vida de modo precário e penoso. Estende-se deste modo o sofrimento, a dor e a angústia do paciente e da família. É o que na linguagem médica e jurídica se conhece por distanásia: tratamentos fúteis ou inúteis, desproporcionais, sem benefícios associados aos procedimentos, por vezes invasivos, que se podem empregar. Para evitá-lo, o Código de Ética Médica dispõe que o médico, diante de situações clínicas irreversíveis e terminais, pode prescindir de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários (art. 41, § 1° do Código de Ética Médica).
Evitar procedimentos desproporcionais não é o mesmo que omitir os recursos ordinários devidos ao paciente, como alimentação ou hidratação, provocando direta ou indiretamente a sua morte. Isto poderia caracterizar a eutanásia. Trata-se de lidar com a morte e com o sofrimento de um modo correto – a chamada ortotanásia – que implica uma abordagem humana e justa, para a qual convergem o direito e a medicina.
Sabemos que entre os desafios bioéticos está a humanização da dor e do sofrimento humano, mas para muitas pessoas a morte se apresenta como um “tabu”. Como consequência desta negação, pessoas que sofrem de doenças incuráveis, em estado terminal, são muitas vezes submetidas de modo até desumano a tratamentos extremos, no intento de postergar a morte a qualquer custo. Porém, ao invés de se prolongar artificialmente o processo de morte, convém considerar os meios para amenizar o sofrimento a lançar o mínimo de stress nesses momentos tão difíceis. O cuidado dos pacientes próximos ao período de óbito envolve diversas atitudes e compromissos, como garantir o controle da dor, assim como tender à integração de aspectos clínicos, psicológicos, e sociais - com a companhia, na medida do possível, dos familiares-, e espirituais. 
Vale mencionar o exemplo de São João Paulo II (BUZZONETTI, R. Deixem-me partir: o poder da fraqueza de João Paulo II. São Paulo: Paulus, 2006, p. 71-72), que propiciou a todos nós um vivo testemunho de equilíbrio entre saber cuidar da própria saúde e ter maturidade para viver bem seus últimos momentos:

 Na manhã de sábado, 2 de abril, pelas 7h30 foi celebrada a missa na presença do Santo Padre que já começava a revelar indícios, embora descontínuos, de comprometimento de seu estado de consciência. Pelo fim da manhã, registrou-se uma brusca subida de temperatura. Pelas 15h30, com voz fraquíssima e palavra estropiada, em língua polaca, o Santo Padre pedia: ‘Deixem-me partir para o Senhor’. Os médicos davam-se conta de que o fim estava iminente e que qualquer novo procedimento terapêutico agressivo teria sido inútil. Pelas 21h37 o Papa exalava seu último suspiro.

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