segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

A doutrina social e as novas tecnologias

Francisco Borba Ribeiro Neto, coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP

Nosso mundo de novas e revolucionárias tecnologias parece maravilhoso, mas paradoxalmente nos enche de temores. Basta ver como a ficção científica imagina o futuro: robôs inteligentes substituem e dominam os humanos, computadores ganham vontade própria, redes de informação destroem a privacidade e a liberdade das pessoas...
Essa mescla de medo e fascínio se baseia em fatos concretos e não só em projeções alarmistas. Paralelamente aos confortos, aos ganhos econômicos, culturais e científicos,; as novas tecnologias também ameaçam os trabalhadores com o risco do desemprego provocado pela automatização e informatização, surpreendem ao mostrar que todas as nossas atividades (deslocamentos, consultas à internet, necessidades pessoais e profissionais) são monitoradas a partir de nossos telefones celulares e computadores pessoais.
Teria a doutrina social da Igreja algo a dizer a essa situação, tão nova e desafiadora? O Papa Francisco, na Laudato si’, nos dá um primeiro discernimento. Escreve:
“A tecnociência, bem orientada, pode produzir coisas realmente valiosas para melhorar a qualidade de vida do ser humano [...] Não podemos, porém, ignorar que a energia nuclear, a biotecnologia, a informática, o conhecimento do nosso próprio DNA e outras potencialidades que adquirimos [...] dão, àqueles que detêm o conhecimento e sobretudo o poder econômico para o desfrutar, um domínio impressionante sobre o conjunto do gênero humano e do mundo inteiro. Nunca a humanidade teve tanto poder sobre si mesma, e nada garante que o utilizará bem, sobretudo se se considera a maneira como o está usando [...] Tende-se a crer que ‘toda a aquisição de poder seja simplesmente progresso, aumento de segurança, de utilidade, de bem-estar, de força vital, de plenitude de valores’ (Romano Guardini), como se a realidade, o bem e a verdade desabrochassem espontaneamente do próprio poder da tecnologia e da economia. A verdade é que ‘o homem moderno não foi educado para o reto uso do poder’ (ibidem)” (LS 103-105).
O poder, enquanto capacidade para fazer coisas, é uma coisa boa, um dom dado a nós por Deus. Mas quando degenera em dominação passa a nos ameaçar. Não estamos sendo educados para usar bem o poder, essa é a ameaça das novas tecnologias, não elas, mas a deseducação para usar bem o poder que elas trazem.
Mas como educar para o reto uso do poder? Esse é o caminho de todo esforço educativo da Igreja ao longo dos séculos, basta ter olhos para ver e ouvidos para ouvir.
Jornal "O São Paulo", edição 3177, 29 de novembro a 5 de dezembro de 2017. 

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